Cassandra
A luz amarelada entrava turva pela vidraça empoeirada do terceiro andar. Se alguma viva alma transitasse por aquela rua esquisitíssima naquele momento poderia ver o corpo do homem completamente nu encostado na janela e com os olhos perdidos. O vento frio passava pela fresta da janela e batia contra a pele de Heitor pregando no corpo o suor do gozo de a poucos minutos. O cabelo crespo, suado, caía-lhe sobre os ombros recobertos de pelos e músculos firmes, fruto do trabalho constante. Olhava para o fim dos tempos e mais além. Via o passado, relembrava as rizadas, repassava cada uma das conversas, o pulso acelerava mais uma vez... Sentia o frio na barriga, filha do medo, da tensão de ser inadequado, de não dar certo. Sentia-lhe novamente o cheiro do cabelo castanho liso, removia-lhe mais uma vez a timidez com aquelas piadas sem graça, mas que como a água iam levando fragmento por fragmento o muro da sisudez própria de Cassandra. O rangido da cama o despertou para a presença dela. ...