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Mostrando postagens de maio, 2014

Cassandra

A luz amarelada entrava turva pela vidraça empoeirada do terceiro andar. Se alguma viva alma transitasse por aquela rua esquisitíssima naquele momento poderia ver o corpo do homem completamente nu encostado na janela e com os olhos perdidos. O vento frio passava pela fresta da janela e batia contra a pele de Heitor pregando no corpo o suor do gozo de a poucos minutos. O cabelo crespo, suado, caía-lhe sobre os ombros recobertos de pelos e músculos firmes, fruto do trabalho constante. Olhava para o fim dos tempos e mais além. Via o passado, relembrava as rizadas, repassava cada uma das conversas, o pulso acelerava mais uma vez... Sentia o frio na barriga, filha do medo, da tensão de ser inadequado, de não dar certo. Sentia-lhe novamente o cheiro do cabelo castanho liso, removia-lhe mais uma vez a timidez com aquelas piadas sem graça, mas que como a água iam levando fragmento por fragmento o muro da sisudez própria de Cassandra. O rangido da cama o despertou para a presença dela.

A mal comida

Sentia a água gelada caindo em gotas grossas pelo corpo. Como precisava daquilo. As noites mal dormidas começavam a cobrar seu preço. Os olhos sempre perdidos tentavam ter o sonho que a noite não conseguira alcançar. A vista somente remetia aos lábios roxos do corpo do pobre pai que há tantos dias não respondia a medicação. Aquele corpo branco e frágil como o de um passarinho mal saído da casca... Casca, era isso que seu pai havia se tornado... Mas ainda não era hora... Por que tão cedo? Ainda havia o moleque pra terminar de educar... Quantas vezes Carolina não se colocara contra a decisão do pai, já idoso mas que mesmo assim decidira adotar uma criança...  O que tinha de velho tinha de teimoso... Agora, no auge da adolescência aborrecida o garoto encontrava-se nas portas de ficar sem pai, mais uma vez... PEM PEM PEM PEM! O despertador a tirou do torpor provocado pelo relaxamento proporcionado pela água... Precisava se apressar. Cabelo, dentes, maquiagem, roupa,