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Mostrando postagens de abril, 2011

Mar de saudades.

Todos chamavam-lhes dois pombinhos. Não gostavam muito da comparação, sempre acharam os pombos promíscuos. Desde que se acharam sabiam que era para a vida toda. Amavam-se com dedicação e paixão. Demoraram muito para se encontrar, muitos até diziam que já passavam da época de ter um par. Esperaram a hora certa, se escolheram. Juntos iam as estrelas e procuravam tocar a lua. Eram felizes. Em um imenso de felicidade ele foi a procura de comida. Tinha ido para o mar procurar alimento para ambos, e para o filhinho que estava para nascer. Passou o dia, veio a noite e ele não voltou. Passaram-se horas, dias e ele não voltava. Ela, remoendo-sem saudade voara sobre o mar. Deixava-se guiar pelo sentimento que carregava no peito e o símbolo da união que trazia no ventre. Batida após batida a força das asas ficava cada vez mais fraca, e a procura cada vez mais intensa. Voara até o amanhecer. Mas naquele dia não houve mais amanhã. E em um mar de saudades se acabou o amor dos dois pelicanos.

A luz das estrelas

Gostava quando a noite chegava, podia ver, lá por detrás das luzes dos postes a beleza das estrelas, brilhavam um brilho calmo e limpo. Ajudava a descansar. Depois de um dia inteiro de pisoteio, desprezo e até de ser cuspida, gostava de relaxar de noite, com o ventinho frio tocando-lhe e as luzes, sim, as luzes das estrelinhas tão distantes. Mas em uma fração de segundos tudo mudara. Que luzes mais esquisitas eram essas, esse amarelo fogo saindo de dentro dos canos pretos, e de repente uma chuva de pedrinhas brilhantes lhe envolvia. Era o vidro, vidro gelado pelo ar condicionado de dentro da sala dos caixas eletrônicos do banco, vieram três, quatros papocos grandes vindos de dentro do prédio e uma profusão de sirenes e gritos. Até que sentiu, em meio ao medo, o calor se depositando sobre ela. Era sangue, ainda cheio de vida, e um, dois, três corpos pesados, imóveis. Desde o começo daquela noite, a pobre calçada não tivera mais sossego, já se iam seis horas e centenas de pés já lhe pisa

As filhas da mesma mãe

Sentia a água correr por seu corpo. O líquido frio passava-lhe pelo peito cabeludo arrastando as sujeiras de dias e dias de poeira, marcha e cansaço. Sentia os pelos arrepiarem-se em busca de calor. Sempre achara engraçado esses carocinhos que apareciam na pele quando sentia frio. Um dia, se possível, pediria para um doutor lhe explicar o por que disso. O cabelo já meio comprido caía perto do ossinho que marcava o fim do pescoço e o começo das costas. Estava mais magro, os últimos dias foram tão corridos que não conseguira comer direito, só um pão velho e dormido aqui ou acolá. E para dar gás, engolia um trago de pinga para esquentar o sangue. Finalizado o banho, enxugava-se lentamente, procurando deixar limpa cada uma das reentrâncias do corpo, esfregava com força entre os dedos dos pés, parecia que ia arrancar o couro, mas queria que tudo estivesse perfeito. O cheiro doce da alfazema entrava-lhe pela narina enquanto banhava-se no líquido perfumado. Vislumbrava o rosto no pedaço de es

Pedrinha miudinha.

"Pedrinha miudinha, pedrinha de aruanda é.." os batuques tocavam alto. Os braços levados por um transe rítmico batiam com força nos atabaques e tambores. Ôoooooooo. Como por um passe de mágica o volume das batidas baixou e ficou fazendo uma música de fundo perfeita enquanto no centro da roda, as barras de renda e miçangas balançavam, circulando rápido e onduladamente. A voz começou a soar. Era baixa, mas forte e precisa. Com um rouco arrastado preenchia todos os cantos do terreiro, chegava a todos os ouvidos, parecia falar dentro e cada alma. - Cadê meu pagamento mizifí? Uma galinha deu seu ultimo cacarejo. Enquanto o sangue escorria sobre a farofa, uma garrafa de cachaça beijou os lábios do santo. Em meio a fumaça a voz mais uma vez fez os corações ficarem gelados. -Hum...Ouvi seu pedido, recebi sua oferta. Agora, para brigar com esse diaxo fraquim tem que fazer outro tipo de sacrifício. Mande aqui o diaxo daquele boi. E apontou com o dedo semi-curvado para um boi magro e f

Mensagem

O vento soprava pela janela de seu quarto. Seria até muita bondade chamar aquela brisa morna de vento. Era lenta e morosa, parecia que até a natureza estava com preguiça por causa do calor. Essa lentidão o deixava louco. Já se passavam tres horas, tres horas e meia, sei lá, se deitara, desde que começara a tentar descansar a cabeça. Que engano, não podia. Rolava de um lado para o outro do colchão, já tentara todas as posições possíveis e imaginávies para adormecer. Arriscara-se a assistir a televisão, ler livros, pensar em histórias. Já adiantara o serviço do dia seguinte. Aventurara-se pelo twitter, facebook, orkut, nada interessante. Estava engasgado. E mais uma vez bolava na cama, já perdera a paciencia e arrancara o lençol. Não conseguia se concetrar em nada, nem em dormir. Minto, em algo ele mantinha seu foco, e era isso que tornava o resto do mundo insípido. Queria aquele ouvido ao seu lado para poder dizer: Te quero, te amo. Mas como poderia dizer? Não sabe ao certo onde estava