A mão

O punho forte e enrijecido pela vida batia com força.
Contemplava-se multifacetado nos pequenos rastros que o vidro fazia diante de seus golpes. Aumentava-lhe a dor, a raiva. Embebido pelo ódio mergulhava mais uma vez o punho. Via-se vermelho. Rubro por dentro e por fora. O vidro banhado pelo sangue teimava em não romper. Aquilo só alimentava sua indignação.
Dentro uma mulher de meia idade gritava de desespero sem conseguir controlar as emoções pelo mínimo de tempo necessário para arrancar dali. Só chorava. Suas lágrimas se misturavam aos cacos de vidros que choviam sobre seu rosto enrubescido de medo e agonia.

O homem maltrapilho - a roupa toda pueril, o cabelo desgrenhado e a barba encaracolada que denunciava seu estado de desequilíbrio - insistia em seus golpes constantes. Vivia uma catarse, entrara em transe e as marteladas contínuas serviam de ritmo hipnótico que o levavam a transportar-se para outro tempo e lugar. Tinha tudo e era feliz. Carro e casa, uma amada mulher e duas menininhas.
Fora numa noite fria, embebida por um vento frio que sinalizava chuva que tudo se acabou. Entrara no quarto: sangue. Uma mãozinha pendia pela borda da cama... Com um baque surdo o vidro se rompeu.

O homem caiu no chão. Envolto em sua própria dor. A mulher enfim conseguia retirar-se do local.
E ali ele ficou. O mesmo quarto. A mesma mão pendente...

Comentários

  1. Nooossaa... muito profundo. Legal ler esse tipo de texto, fico me perguntando sempre como é que a mente humana consegue projetar situações tão perfeitas que parecem reais... Agente escreve e até parece que viveu ou assistiu aos fatos, sente o que o personagem sente... acaba de escrever o texto arrasado. E é assim que a emoção passa pro leitor... Parabéns Dhenis...

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  2. Adorei!
    Muito bom...mexe com a mente alheia.

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