Espera!

Era noite, fria, mas sem vento. Do décimo quinto andar conseguia ver as luzes das ruas, os carros que mesmo na madrugada ainda teimavam em passar. Enrolado no lençol, pensava nela. Sentia-lhe o cheiro. O suor que escorrera-lhe do corpo, misturou-se com o perfume e deixou uma fragância única impregnada no pano da cama onde a poucou foram felizes. Ele plenamente. Há meses sonhava com ela. Tinha observado a garota por todo o ano letivo, e agora conseguira o que queria, mas queria mais. Queria-a novamente, e novemente, e novamente... Ela disse não posso. Enfiou-lhe o dedo na cara e disse que tudo estava errado. Ele não conseguia entender. Estavam juntos, estavam felizes, era o que tinha que ser. Saíra correndo do apartamento. Ainda despenteado ele correu, saiu da porta com a blusa ainda pela metade da barriga. Ela esperava, impaciente e pensativa o elevador. Sentiu sua aproximação. Com um olhar disse basta. Muito mais que gritos e braçadas, ela lhe olhou, e ele entendeu. Ela precisava de um tempo. Mas até quando iria durar esse tempo? Não podia esperar para sempre, cinco horas já era tempo de mais. Pegou o violão surrado com que o pai estudara há mais de vinte anos e que ficara de herança, uma das poucas que o trabalhador conseguira deixar para o filho. Conhecia dois ou tres acordes mal feitos. Tocou, sem se preocupar com o que saia. Mas precisava fazer sair. O silêncio era um demônio que consumia suas entranhas, então que fosse exorcizado com o som do instrumento. Transcedia. O tempo e o espaço iam se confundindo com a vibração das cordas vira-a linda, ao sol, com o cabelo molhado pela água do mar, correndo cansada das ondas que nunca pegaram. Sentia o cheiro das flores que preenchiam todo o campo ao redor da grama meio queimada de sol que lhes espetava os pés, mas que lhes permitiam uma experiência única de contato com a natureza. Sentia-lhe o corpo, a pele macia mas com os poros abertos pelo frio da noite chuvosa sobre a qual se beijavam enquanto ele acariava seu corpo languido. Peeeeeeeeeeeeeeeeeeeennnnnnnnnnnnnn.... Crack.... dois carros bateram mesmo na esquina do apartamento. O transe estava desfeito, voltava para a sua própria vida de amor e espera e para contentar-se ficou a sentir saudade do que nunca foi.

Comentários

  1. eiiita, gostei. O texto adquire um ritmo muiito massa quando a gente tá lendo, e é quebrado justamente na hora da batida dos carros, pra finalizar o texto. Superenvolve o leitor.

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