Cheiro do amor

Com o dorso da mão limpou a lágrima teimosa que escorria solitária pela bochecha rosada.
O cabelo preso em um coque prático no alto da cabeça a impedia de esconder a emoção.
Já se passavam anos de convívio.
Lado a lado viveram momentos marcantes.
Ele estava presente na vida dela há tanto tempo que nem parecia não ter estado.
Mas a rotina os desgastara.
A vida a dois era boa, mas sempre fora adepta de demonstrações de afeto.
Por gosto dela já foram balões suficientes para erguer uma família. Roseiras inteiras entregues em oblação aquele amor. Tantas frases escritas no vapor do chuveiro elétrico que dava pra montar um livro, e não seria um fininho como aqueles de autoajuda, chegaria quase à um George Martin.
Sentia falta dessas provas.
Há meses aguardava ansiosa o dia em que ele demonstraria seus sentimentos.
Há semanas temia que fosse para um adeus amargo.
Mas aquele cheiro... aquele som dizia tudo.
O odor que entrou queimando os pelos do nariz acompanhado daquela estridência monocórdia dizia tanto.
Seu peido farto pela comida posta a pouco sobre a mesa mostrava a satisfação.
Dava a certeza de que se encontrava no lar.
Estava em casa.
Ela entendeu tudo.
Aquele ainda era o lar dele.
Ela ainda era a sua mulher.
Com o sorriso feliz quebrando a careta da catinga virou-se, deu dois passos ligeiros e beijou-o com a boca ainda salgada das lágrimas.
Ela a amava.
Eram felizes.

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