A fruta

Ofereceste-me uma fruta tão bela e estava eu tão sedento...
Com ferocidade queria provar do suco, chupar os gomos e esfregar-me no bagaço.

A fome urgia, gemia, punia.
Fazia-me não mais autônomo mas sim um servo da vontade de comer.
O raciocínio é filho de mentes sãs e satisfeitas...
Pensasse com o cérebro e sente-se com o coração diziam eles...

A mim, tudo parece se resumir ao estômago.
A fome destrói qualquer possibilidade de sentir-se humano.
A fome indispõe-nos completamente ao diálogo e a elucubração...
A fome dói e ponto. Demanda ser saciada...

E assim estava depois tantos anos de abnegação.
De entregar-me completamente a doar... esqueci de comer...
Mas uma hora o estômago falou mais alto. Uma hora ele tinha que falar.
E nessa justa hora, ofereceste-me aquele fruta.
Linda e suculenta...

Estava envenenada... O doce que sentia era do curare que me davas.
Mas, diria não se soubesse?
Procuraria-o menos ainda se soubesse que logo estaria a arquejar?
Provavelmente não... afinal... eles podem até dizer que tudo se resume a encéfalo e coração...
Nós sabemos muito bem que não...  

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