Clichê (s)

A alma combinava perfeitamente com o corpo cansado.
Sentia a ponta dos dedos frias como se tivesse acabado de pegar em cubos de gelo.
Teve meio milionésimo de segundo de satisfação ao arrumar coragem (nos dois sentidos do termo) para levantar-se da cadeira do computador onde estava sentado desde que chegou ao trabalho pela manhã cedo, e fugiu para casa faltando sete minutos para as cinco horas.
Era uma rebeldia tosca, mas era alguma.
De dentro do carro vivia um clichê.
As mãos guiavam o volante do carro pela pista de alta velocidade enquanto os olhos perdidos em um vazio distante vislumbrava apenas os vultos dos carros adiante de si. A mente absorta parecia hipnotizada pela trilha de fundo com as guitarras arrastadas e a voz melodiosa de Caetano que pregava que o lugar mais frio do Rio era o seu quarto... Que fosse, mas por essas bandas, sabia muito bem onde parecia ter se concentrado todo o frio e letargia do Nordeste.
Em um soluço de vontade virou a direita onde sempre seguia reto.
Uma, duas ruas depois e lá estava um campinho verde das chuvas recentes, que mal se iam, deixavam o mormaço como companhia. Dentro dele duas crianças guiavam um cavalo bonito.
Quase pensou em se animar, mas havia espaço de menos naquele carro para dois clichês.
Acabou permanecendo triste e só.

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