Marcelo e Luana

Vinha caminhando pela rua, passo lento, cabeça baixa, as pernas formigando e o peito pesado.
O caminho para casa nunca parecera tão grande.

Acompanhava com o olhar a marca branca da beirada da sarjeta, mas ver mesmo, não via nada, sua mente estava a quatro quarteirões, junto com duas florzinhas e um coração.

Marcelo conhecera Luana a dois anos, e ao olhar para ela sabia, era ela, ela era a garota.
E ela foi, a garota de seus sonhos, sonhos de beijos que começavam suaves e que iam ganhando uma intensidade que lhe fazia parar de pensar. Foi por ela que entrara nas aulinhas de inglês e conhecera Led Zepelin, Rollings Stones e Sex Pistols. Foram dois anos vivendo mais por ela do que por ele mesmo. Deixara o cabelo crescer para ficar mais parecido com aqueles caras legais de seriado americano. Tentara falar com ela e dizer o que sentia, mas tudo parecia tão ridículo. Tão ridículo quanto aquele maldito cartão que lhe enviara anonimamente no dia dos namorados. Tão ridículo quanto esse cheiro estranho do perfume que roubara do guarda-roupas do irmão mais velho, que sempre se dera bem com as meninas, mesmo sendo tão...ridículo.

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Ela estava satisfeita, não feliz, ele tinha os braços fortes e um jeito legal, era bonitinho, apesar de não ter um papo muito legal, mas fazer o que?
Foram no máximo três beijos, não mais. Ele se foi, e Luana ficou sozinha de novo no meio do jardim, obviamente sugestão dela. Ah, aquele jardim era tão bonito, tinha um cheiro agradável, de limpeza e ao mesmo tempo de uma sujeira gostosa. Sem falar naquelas cores, cada uma mais impressionante que a outra, violeta, rosa, até umas meio azuladas.
Ia pro rumo de casa quando viu umas florzinhas tão bonitas, jogadas no chão, estavam embrulhadas com uma fitinha vermelha que tinha uns detalhes dourados que davam a elas um charme todo especial. Pegou-as e ficou sonhando voltando para casa, como seria bom ter recebido um buquê desses, tão simples e ao mesmo tempo tão bonito.
Queria alguém que tivesse mais a oferecer do que apenas um bom beijo, queria alguém que lhe entendesse.
O caminho pra casa ficara bem maior do que o de costume, peito ficara apertado, precisava conversar com alguém.

Quando chegou em casa ligou para o seu único amigo que entenderia o que queria dizer.

Marcelo atendeu o telefone, com uma voz embargada, como se tivesse estado a chorar. Era ela, mais uma vez com aquela historia de que queria alguém que a entendesse, ele não aguentou, disse-lhe tudo, falou cada palavra. Talvez tenha sido aquela sensação de segurança que o telefone dá, por não permitir que a gente veja o rosto da pessoa que está do outro lado.
Cuspiu cada palavra. Ela tentou falar, dizer que entendia o que ele sentia, pediu a palavra, uma duas vezes, ele não deixou. E quando terminou entendeu. Ele entendeu.

Pediu desculpas, desligou o telefone e foi viver.

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Três anos depois se encontraram em uma fila de cinema - Há quanto tempo? Como vão as coisas? Por onde você andou?
Perderam o filme, resolveram conversar um pouco mais, ele se tornara músico, instrumentista. Ela, professora.

Beijaram-se uma, duas, três vezes, entraram no carro dele...
Acordaram com o sol atravessando a janela e queimando-lhes o rosto.
Ele tinha que ir embora, tinha uma vida pra viver.

Foram felizes. Durante algumas horas foram eternos.

E se foram.

Comentários

  1. Uau.acabei de ler e tô sem palavras... é incrível Dhenis, vc devia reunir seu textos num livro...

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